Ira no Irã
O interior da mesquita Imã Khomeini, em Isfahan
Visitei a Pérsia, digo, o Irã quando mais se falava nos “iminentes” bombardeios de Israel ao país. Nas quase duas semanas em que estive lá, isso me causou apreensão, mas felizmente nada aconteceu. O inusitado convite partiu de uma amiga cujo filho vive em Teerã. Do primeiro telefonema ao desembarque de madrugada no aeroporto Imã Khomeini, de Teerã, foram apenas 20 dias. Pouco antes do pouso, as comissárias da Lufhansa colocaram lenços sobre a cabeça, observando o preceito religioso que impede que as mulheres no Irã deixem cabelos (e braços e pernas) expostos. Por isso, também fomos “convidadas” a usar o acessório.
Horas depois, minha primeira manhã em Teerã me brindou com a visão de algo inédito em minha vida: neve. Teerã, metrópole com cerca de 8 milhões de habitantes, é cercada por montanhas altíssimas (como o Monte Damavand, de 5 671 metros, que parece o Fuji) que emolduram atrações que poderiam estar perfeitamente no Ocidente: edifícios arrojados, redes de hotéis, restaurantes luxuosos, palácios, museus, poluição. Nos shoppings, vi marcas internacionais com pequenas modificações, o que lhes dava um look mais oriental. Antes de chegar a Teerã, treinei o uso do chador, o tecido longo, quase sempre preto, que só deixa o rosto descoberto, mas vi pelas ruas que as mais jovens não se preocupavam em cobrir totalmente os cabelos. Era mais difícil a vida das mulheres, me disseram, logo após a revolução islâmica de 1979, que varreu o xá Reza Pahlevi do poder. Então troquei o chador pelo maghnaeh, uma espécie de capuz, muito mais prático.
Naquele primeiro dia, fui com minha amiga ao Grande Bazar. Sem trocadilho, um verdadeiro mercado persa. Entramos por um portal e seguimos em ziguezague por corredores estreitos pontilhados de lojas, tendas, recantos, pátios. Em poucas horas tive a impressãode ver desfilar toda a Pérsia em cores, sons, paladares e odores. Visitamos também o Museu Saadat Abad, a antiga residência de verão do xá. Percorrendo as salas é possível ver o mobiliário e os finos objetos usados pela família antes da queda. Na entrada do complexo, sob uma grande tenda, estão expostos alguns dos automóveis da coleção do monarca, diferentes modelos de Rolls-Royce e Mercedes, entre outros. No Palácio Golestan (Jardim das Rosas), outra atração da capital, fomos cercadas por um grupo de jovens estudantes. Empunhando celulares, as garotas fizeram interrogatórios cujas respostas eram gravadas. Queriam saber de onde vínhamos, que língua falávamos e, principalmente, se gostávamos deles.
Iranianas vestidas conforme as leis islâmicas no Bazar de Shiraz
Quem vai ao Irã tem uma imersão profunda nos costumes locais até nas coisas triviais, como pagar um táxi. É que nessa hora os motoristas dizem: “Não precisa, não é nada”. Mas não é bem assim, e um longo diálogo se segue até que surja no horizonte um acordorazoável. Euzinha, que tenho a tendência a ser crédula e ingênua, se não tivesse sido informada previamente sobre isso, sairia batendo a porta com um “Deus lhe pague!” Esse é um aspecto da cultura persa muito arraigado. O local sempre recusa – por delicadeza – algo oferecido, mesmo que se trate de um justo pagamento por produto ou serviço. Ele fala diversas vezes “Não posso aceitar” e, por fim, algo como “Só aceitarei por sua insistência”.
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